A primeira mulher presidente do País vai encontrar políticas de gênero que têm menos da metade dos recursos que necessitam. A proposta orçamentária de 2011 prevê R$ 225 milhões. Além de faltar recursos, os que chegam para as ações do setor enfrentam a baixa execução do dinheiro- o que é efetivamente pago daquilo que foi autorizado.
Dos R$ 35,5 milhões autorizados nos orçamentos de 2008, 2009 e 2010 para atenção integral á saúde da mulher, por exemplo, só R$55 foram efetivamente gastos e liquidados. A pouca verba- e o que de fato é gasto dela – é a face monetária dos problemas enfrentados pelas ações de gênero, que avançam em áreas como o combate á violência contra a mulher, mas ainda deixam a desejar em setores como a presença das mulheres no mercado de trabalho.
Os dados do orçamento vêm de um boletim inédito concluído pela ONG Cfemea (Centro Feminista de Estudos e Assessoria), responsável pelo “Orçamento Mulher” presente no siga Brasil, sistema de informações orçamentárias do Senado, com dados como os do Siafi.
Segundo esse boletim, o orçamento proposto em 2011 para combate a violência contra a mulher é 35% menor do que o autorizado na Lei Orçamentária Anual de 2010. O valor caiu de R$ 39,27 milhões para R$ 25,7 milhões. Além disso, o Projeto de Lei Orçamentária Anual de 2011 traz o menor montante autorizado para esse programa dos últimos anos, quando comparado com os valores autorizados em 2008, 2009 e 2010.
Já quando se olha a execução de todo o “Orçamento Mulher” para 2010, o estudo aponta que, até 21 de outubro deste ano, apenas 30% do orçamento em 2010 foram executados. “A área da saúde da mulher é uma das que ainda precisam avançar mais. Só no ano passado, morreram 1.513 mulheres por problemas na gravidez, parto ou pós-parto”, diz Sarah Reis, do Cfemea. Em 2009, o índice de mortalidade materna ficou em 75 mortes de mulheres a cada 100 mil nascidos vivos. A meta do governo é de redução de pelo menos 15% desse índice.
Outro setor, nas políticas de gênero, que preocupa pesquisadores é o que chamam de autonomia econômica das mulheres. Apesar de dado do Ipea divulgados este ano mostrarem que, entre 2001 e 2009, o percentual de famílias chefiadas por mulheres subiu de cerca de 27% para 35%, a participação de mulheres no mercado de trabalho é de 64% contra 85% dos homens, segundo o Pnud.
SALÁRIOS CONTINUAM DESIGUAIS. HOMENS GANHAM MAIS DO QUE MULHERES.
A equiparação salarial também não melhorou no País: enquanto o homem branco ganha em média R$ 1, 411 por mês, a mulher branca ganha R$ 889, e a negra, praticamente a metade, R$498,00 ( o homem negro ganha R$ 757,00).
Guacira Cesar de Oliveira, assessora técnica do Cfemea, lembra que, na População Economicamente Ativa (PEA) feminina no País, o maior setor, com 20%, é o das empregadas domésticas – o que mostra a baixa qualificação do trabalho feminino no País, apesar do bom nível das mulheres no quesito escolaridade (segundo o Pnud, 48 % das mulheres com 25 anos ou mais têm pelo menos o ensino médio completo, 2,5 pontos percentuais á frente dos homens).
È como doméstica que Raimunda Melo trabalha há oito anos, desde que chegou ao Rio da cidade maranhense de Coroatá. Também vende água na central do Brasil para completar com mais uns R$ 50 por dia a renda mensal de 1mínimo: “Agora estou fazendo um curso de radiologia. Para ver se consigo algo melhor, né, porque isso aqui é pauleira.”
“Houve uma expansão do combate á violência contra a mulher, com a criação da Lei Maria da Penha e de um plano de enfrentamento a essa violência. Mas o ingresso no mercado de trabalho ainda precisa de ação mais incisiva da secretaria. Falta política para creches públicas, que liberam a mulher para o trabalho. Mas as creches entram na lógica de que são responsabilidade dos municípios. Eles fazem pouco, a União investe pouco, e a creche infelizmente segue sendo problema só das mulheres”, afirma Ana Alice Alcântara, coordenadora de pós-graduação sobre gênero da UFBA. Segundo Cfemea, apesar de terem sido construídas, desde 2007, mais de 1,7 mil creches e pré- escolas, o numero de matriculas na educação infantil teria crescido apenas 0,8% no período. Estudo da professora Bila Sorj, da Unicamp, mostra, porém, que as mulheres que têm com quem deixar os filhos ganham salários 55% superiores aos das que não têm.
Fonte: Rio de Janeiro Agência O Globo.
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