terça-feira, 22 de março de 2011

Divisão dos royalties mobiliza Estados

Jornal: Valor Econômico
 
Congresso : Não produtores articulam movimento por mudança
Raquel Ulhôa | De Brasília
Deputados de Estados não produtores de petróleo começam a se rearticular na Câmara para alterar o projeto de lei enviado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Congresso, no último dia do seu mandato, fixando regra de repartição dos royalties provenientes da exploração da camada pré-sal pelo modelo de partilha de produção (que substituirá o sistema de contrato de concessão).

Esses parlamentares consideram alto o volume de royalties destinado no projeto de Lula aos Estados (25%) e municípios (6%) produtores confrontantes (cujo litoral fica defronte dos campos).

O movimento envolve parlamentares de todas as regiões, especialmente do Nordeste, que consideram insuficiente a redistribuição dos royalties entre Estados produtores (Rio de Janeiro e Espírito Santo) e não produtores proposta por Lula. O projeto restabelece acordo do ex-presidente com governadores.

A ideia é tentar acordo em torno de um meio termo entre a proposta do governo e a chamada "emenda Ibsen", aprovada pelo Congresso no ano passado e vetada pelo ex-presidente por ser considerada muito radical. A emenda acabava com o tratamento diferenciado dos Estados produtores na divisão dos royalties do petróleo localizado no mar (pré-sal ou não) e mexia até com os contratos em vigor.

O governo aguarda a aprovação desse projeto para realizar o primeiro leilão do pré-sal no modelo de partilha, porque o veto de Lula deixou um vácuo legal na questão dos royalties do pré-sal explorado no modelo de partilha.

A legislação em vigor ficou sem definição da regra de repartição desses recursos e até sem estabelecer qual será o volume de royalties. O projeto do governo estabelece que as empresas contratadas pagarão mensalmente o correspondente a 15% da produção de petróleo ou gás natural a título de royalties (no contrato de concessão, os royalties correspondem a 10% da produção).

O projeto de Lula está na Comissão de Minas e Energia da Câmara, aguardando designação de relator pelo presidente, Luiz Fernando Faria (PP-MG). O mineiro pretende fazê-lo nesta semana, mas parlamentares do Nordeste querem levar a discussão para uma comissão especial, procedimento previsto no regimento da Casa quando um projeto tem conteúdo para ser submetido a três ou mais comissões permanentes.

O pedido de criação da comissão especial foi feito pelo deputado José Guimarães (PT-CE), em requerimento apresentado no plenário no dia 2 de março. Guimarães aguarda decisão do presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS). Na sua opinião, apenas uma comissão especial tem condições de buscar o entendimento necessário à viabilização de uma nova regra para os royalties.

"A Casa é política. Tudo que não for resultado de entendimento fica comprometido, como foi o caso da regra de divisão dos royalties aprovada no ano passado por Câmara e Senado, que acabou vetada", disse. Segundo ele, a intenção é discutir a distribuição dos royalties sem a influência dos interesses eleitorais que dominaram os debates em 2010.

O líder do governo, Cândido Vaccarezza (PT-SP), admite que, se a proposta não for votada logo, sofrerá novamente a influência eleitoral, já que em 2012 serão realizadas as eleições municipais. "Não temos muito como nos livrar da pressão eleitoral", diz ele.

A questão dos royalties, que mobilizou Câmara e Senado no final do governo Lula, não está sendo tratada como prioridade. A tarefa de Vaccarezza agora é aprovar as medidas provisórias que estão trancando a pauta da Câmara (já são sete, mas outras dez são aguardadas). Depois, ele pretende conversar com Marco Maia sobre a ideia da comissão especial e sobre a escolha do relator. "Não pode ser alguém militante de uma das duas posições [a dos Estados produtores e a dos demais]."

O projeto enviado pelo ex-presidente ao Congresso para substituir o artigo vetado inclui a regra resultante de acordo feito com governadores durante a tramitação do projetos do marco regulatório do pré-sal (modelo de partilha de produção, fundo social, capitalização da Petrobras e estatal que irá representar a União nos contratos).

A proposta não mexe com os royalties oriundos do pré-sal explorado nos campos já licitados, ou seja, preserva os ganhos atuais do Rio e do Espírito Santo.

Com relação aos contratos futuros, o critério é o seguinte: 25% vão para Estados produtores confrontantes, 6% para os municípios produtores confrontantes, 3% para municípios afetados pelas operações de embarque e desembarque, 19% para a União (destinados ao Fundo Social) e 3% para ações de mitigação e adaptação às mudanças climáticas.

O restante é destinado a todos os entes da federação, da seguinte forma: 22% para um fundo especial a ser distribuído entre todos os Estados e o Distrito Federal pelos critérios do Fundo de Participação dos Estados (FPE) e 22% para todos os municípios, repartidos pelos critérios do Fundo de Participação dos Municípios (FPM).

Para o deputado Pedro Eugênio (PT-PE), o projeto é "insuficiente", porque mantém o tratamento de "produtores" a Estados e municípios cujos litorais ficam a centenas de quilômetros da costa, no caso do pré-sal. "Por essa regra proposta, 31% dos recursos ficam com Estados e municípios que não sofrem tanto o impacto das operações no caso do pré-sal e hoje já são muito bem aquinhoados. É muito. Pode haver maior equilíbrio", diz ele.

O líder do PMDB, Henrique Eduardo Alves (RN), era relator do projeto de lei que tratava da partilha de produção e encampou essa regra. Na votação, o plenário rejeitou e aprovou emenda de Ibsen Pinheiro (PMDB-RS) e outros, que acabava com o tratamento diferenciado dos Estados produtores até com relação aos contratos já firmados.

Agora, o sentimento predominante é que a emenda era radical demais, mesmo com a aprovação no Senado de emenda do senador Pedro Simon (PMDB-RS) obrigando a União a compensar as perdas do Rio e do Espírito Santo.

Por isso, os deputados pretendem fazer "ajustes" no projeto em vez de tentar derrubar o veto presidencial, o que exige maioria absoluta dos votos da Câmara e do Senado, em sessão conjunta do Congresso. "Não vamos conseguir voltar ao texto de Ibsen, mas podemos conseguir uma distribuição melhor, aumentando o ganho dos não produtores, mas preservando o que os produtores recebem hoje", diz Júlio Delgado (PSB-MG), outro parlamentar envolvido.

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